Semana passada conheci o senhor Luis Carlos, um taxista transtornado com o tráfego de Porto Alegre, que já está bem complicado às 14:00 (aliás, algum motorista não se encaixa nessa descrição?). Enfim, aproveitando a deixa dos reclames e suspiros do Seu Luis, perguntei o que ele pensava sobre as bicicletas no trânsito.

_ Coisa boa! Desafoga essa tranqueira, é a melhor coisa mesmo! - me diz convicto.

Fiquei instantaneamente feliz. Eu que já levei fininho e buzina de taxista sem merecer e, pior, presenciei essas coisas como passageira do táxi (grrrr...) não esperava essa resposta de um senhor que já estava resmungandinho. Resolvi testar um pouco mais a fé do homem.

_ É mesmo? Já vi muito taxista que não gosta, sabe? Que reclamam e às vezes até se prevalece. - provoquei.

Juro que ele ficou perturbado e largou:

_ Só se são loucos esses aí, eu respeito bicicleta, melhor coisa que inventaram!

Ele até poderia ter defendido a classe recorrendo às mancadas que os ciclistas às vezes aprontam. Tá certo que no trânsito os maiores devem zelar pela segurança dos menores, mas a gente como ciclista também tem uma conduta responsável a seguir e alguns ainda dão uma escorregada. E tem o velho problema da infraestrutura urbana, desenhada com a lógica do veículo e despreparada para essa presença cada vez maior de bicicletas que vemos nas ruas por aqui. Mesmo colocando tudo isso na conta, o que importa para o Seu Luis, motorista profissional, é que um trânsito com a participação de bicicletas é um trânsito melhor. O legal é saber que tem muita gente pensando como ele, uma ótima notícia pra não perder a esperança na humanidade.

Seu Luis me contou que aprendeu a pedalar aos 15 anos, ensinou os filhos quando eram bem mais novinhos que isso (hoje em dia as crianças aprendem tudo muito mais cedo, diz), mas que já não sobe mais em bicicleta, porque, contrariando o senso popular, tem certeza que desaprendeu a andar em uma e sabe que vai cair de cara no chão se resolver fazê-lo. Deixa o hobby para a mulher e os filhos. Ele estava bastante convicto, nem tentei dissuadi-lo. Quem sabe um dia ele dá outra chance pra essa antiga paixão, né? Pra variar um pouquinho.











No livro "Tatuagem, piercing e outras mensagens do corpo", Leusa Araújo diz que em todos os lugares do mundo e em todas as épocas o homem se utilizou do corpo como forma de linguagem, às vezes traçando na pele algo que poderia ser entendido como um tipo de diário de sua vida.

"Mostre-me um homem com uma tatuagem e eu lhe mostrarei um homem com um passado interessante", já diria Jack London. E é isso mesmo que acontece, questão de história e amor. A tatuagem faz parte de cultura urbana da bicicleta e tem muita gente que deixa transbordar esse sentimento profundo e resolve eternizar a relação com as bikes em sua superfície.

Aqui estão alguns exemplos bacanas de bike tatoos. As imagens são de fontes variadas, descobertas em pesquisa livre.

Quem tem tatuagem de bicicleta por aqui?













































Achou incrível mas não está pronto pra fazer uma tatuagem definitiva? A Tattly é um loja online de tatuagens removíveis que tem uma categoria só para bicicletas. Elas são lindas, baratinhas (por 5 dólares você compra um kit com duas iguais + 2 dólares para o frete) e tem entrega para o Brasil <3. Olha só:




 








UPDATE:

Chegou foto da leitora Tássia Dias Furtado. Na foto, as pernocas dela e de um amigo. Aliás, ela me contou que tem uns 6 amigos com essa mesma tatuagem de correia. Legal, né?









No último sábado, 1 de dezembro, o Bicicleta é amor organizou a Pedalada Gentil do Fim do Mundo em Porto Alegre, junto com o vereador e ciclista Marcelo Sgarbossa e com uma mãozinha dos coletivos culturais Casa Fora do Eixo e da Casa de Cultura Digital. A Pedalada fez parte da programação do Festival 24 Horas para o Fim do Mundo, uma iniciativa muito legal que promoveu vários eventos de música, arte, moda, bem estar e cultura pela cidade.




E o que essa pedalada tinha de gentil? Ora, ela convocou a simpatia e bom humor de gente do bem, disposta a participar de uma ação simples de gentileza pra pedir mais amor no trânsito e o uso compartilhado dos espaços urbanos: a entrega de um doce com essa mensagem aí embaixo para pedestres e motoristas que cruzassem o nosso caminho.




Foi o que fizemos, mas eu, que queria tocar a cidade com um gesto amável, fui pega de surpresa por aquele velho mantra "Gentileza gera Gentileza", e acabei recebendo muito mais carinho do que acredito ter proporcionado. Esse post é pra registrar e valorizar as pequenas emoções que tocaram delicadamente o coração desse projeto (e dessa guria que está nos bastidores fazendo a roda girar). Não sei se as pessoas que participaram entenderam as felicidades que me proporcionaram. A presença de cada um foi importante, mas preciso registrar os meus picos de gratidão.

Em nome de um trânsito mais legal, de fazer o bem, ou mesmo de participar de um programinha buena onda no sábado à tarde, uma galera apareceu pra pedalada que só foi confirmada na última hora, quando São Pedro resolveu dar uma trégua sem oferecer grandes garantias dessa boa vontade repentina. Essa foi a primeira coisa que me emocionou: essas pessoas que eu até então nunca havia visto apareceram pra fazer tudo acontecer. Um aviso do moço Henrique Weyne mais cedo na página do evento dizendo que viria mesmo debaixo de chuva já tinha me devolvido a empolgação que a garoa tentou roubar e quando pensei que o público seria praticamente nulo, vi os corações que preparei pra identificar e enfeitar as bicicletas participantes se acabando rapidamente.

Minha próxima grande felicidade foi ver ali os meus amigos de fé que gastaram as pernocas pedalando no Massa Crítica pela primeira vez no dia anterior, onde também preparei uma surpresinha, firmes, fortes e cansados pra me acompanhar numa segunda rodada de pedal. Raquel Scodro e Felipe Graff, sem palavras pra vocês!

Outra delicadeza absurda veio do Bruno Mallmann, que podia muito bem virar garoto propaganda do passeio por ser o menino mais gentil que eu já conheci. Ele chegou me perguntando quem organizava aquilo tudo e explicando que tinha vontade de ajudar, mas não sabia como, tentou até oferecer uma doação pra valorizar o trabalho e se sentir parte daquilo. Ajuda de custo não era o objetivo ali, mas coloquei ele pra trabalhar, explicar o objetivo da pedalada pra quem ia chegando e ele fez isso melhor que eu mesma, com uma simpatia que só vendo. Obrigada, guri, dessa tua queridice eu não vou esquecer.

Depois chegou a Marília Saldanha pra me deixar toda serelepe. Ela veio me perguntando a que horas seria dada a largada, pra ela poder alugar uma bicicleta na hora certa. Sim, ele apareceu na pedalada querendo participar, mesmo sem ter uma bicicleta. Como não amar? Palmas pra ti, moça.

E o Marco Di Martino? Um querido de um moço tímido, que vendo os pirulitos que preparei pra serem entregues a quem cruzasse o nosso caminho, me olhou e disse: "Eu não sou bom nisso, não gosto de abordar as pessoas, tenho vergonha... Mas me dá aqui, vou tentar." E ele insistiu em se desafiar mesmo quando o deixei à vontade pra apenas seguir a pedalada. Fiquei emocionada quando terminamos o trajeto e ele me disse: "Pronto, entreguei o último!" Sério! Sério.

Marcelo Sgarbossa, claro, garantiu que tudo corresse bem e se converteu na empatia em pessoa quando desceu da bicicleta pra me acompanhar a pé na única (porém cruel) subida do percurso. Não tive pernas suficientes pra encarar, mas em minha defesa posso dizer que a Cecília não tem marchas e eu estou longe de ter um preparo de atleta. O importante é que não fiquei sozinha :).

Vontade de abraçar também os velhinhos do Bom Fim, que respondiam felizes aos nossos cumprimentos de boa tarde por onde passávamos. Com isso, toda a doçura que a gente distribuiu voltou pra nós, né?

Quem fez o trajeto até o final acabou assistindo a um showzinho na grama da Redenção e batendo um papo com os novos amigos até que os sapos do parque começassem a rir da gente.

Se conseguimos introjetar a ideia de que todos, ciclistas, motoristas, pedestres, podemos aproveitar juntos a nossa cidade e cuidar uns dos outros, ainda não sei, mas acredito que quem se envolveu nessa aventura saiu um pouquinho transformado (e eu sou a primeira), entendeu a mensagem e vai tentar levar adiante. De gentileza em gentileza, agora aprendi, conseguimos transformar o nosso entorno. Só me resta dizer um grande obrigada pra essa gente boa!



























 


Fotos de Casa Fora do Eixo Porto Alegre, Raquel Scodro, Bruna Guterres, Kin Viana e Bicicleta é amor.